quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

O ANJO DA MORTE


Louis Antoine de Saint-Just (1767/1794)


"Saint-Just subiu lentamente à tribuna e, pronunciando sem paixão um discurso atroz, disse que não se devia julgar longamente o rei, mas simplesmente matá-lo. É preciso matá-lo, não existem mais leis para o julgar, ele próprio as destruiu.

É preciso matá-lo como inimigo; só um cidadão pode ser julgado; para julgar o tirano, seria preciso começar por fazer dele um cidadão.

É preciso matá-lo, como culpado, apanhado em flagrante delito, com a mão no sangue. A realeza é, aliás, um crime eterno; o rei está fora da natureza; do povo ao rei, não existe nenhuma relação."

"História da Revolução Francesa" (Jules Michelet)

O autor deste discurso tinha só 25 anos. Escrevera uns versos inspirados em Voltaire há pouco mais de um mês e estava agora, ali, no seu porte rígido, o pescoço "como que suprimido pela gravata, pelo colarinho rijo e alto", mais a sua retórica de romano antigo.

"A atrocidade do discurso produziu um grande êxito, devido ao espanto."

Michelet viu na desconfiança e na suspeição sistemáticas o vício próprio dos jacobinos.

Com Saint-Just, eles encontraram o grande depurador. Sem passado, sem defeitos, um verdadeiro anjo da Morte. Ainda por cima, uma espécie de andrógino. Se não fossem uns "olhos azuis fixos e duros", poderia passar por uma mulher.

Até ali a sorte de Luís XVI não estava ainda decidida; o rei estava quase esquecido na prisão do Templo.

Agora, a moderação, assustada, voou da assembleia e todos caíram sob o fascínio da lógica personificada, uma lógica sem subterfúgios.

Nenhuma ideia tem tanta força como aquela que incubamos, que já nos venceu interiormente, apesar de não ter sido ainda formulada.

O Catilina da Revolução deu-lhe a forma acabada, peremptória, que não encontrou resistência, mas o assombro e o medo.

E por isto se vê como a Razão das Luzes era ainda dogmática e não sabia julgar-se a si mesma.

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