quinta-feira, 16 de novembro de 2017

A FÉNIX SEM MEMÓRIA

(Buda gigante de Bamyán)


"Tomemos como exemplo os primeiros cristãos. Eles abandonaram a cultura pagã e foram para os desertos, para o espaço mais profano da sua época. Esta partida pode ser interpretada como uma destruição simbólica da cultura. No fundo, o eremitismo cristão é uma inovação que revaloriza o profano e desvaloriza os valores estabelecidos."

"Du Nouveau" (Boris Groys)

A gruta dos eremitas vai adquirir "mais valor do que os valores mais antigos. No decorrer do tempo, constroem-se nesse lugar igrejas cada vez mais sumptuosas, ornadas de frescos e de oferendas votivas. Mas são sempre as relíquias do santo homem que constituem o maior valor, assim como um pequeno número de coisas simples, quotidianas que ele utilizou - o ready-made da sua santa vida, se quisermos."

Os talibãs que destruíram os Budas gigantes de Bamiyán não acabaram com uma real ou suposta idolatria, apenas transferiram o valor dessas estátuas para a cultura kitsch do proselitismo islâmico. E se tivessem "world enough and time", no próprio lugar da destruição, simbólica ao mesmo tempo que real, veríamos erguer-se o templo ou o museu dos novos valores.

Por muito crua que nos pareça esta "transvaloração", se pensarmos no que o Cristianismo fez aos mais belos templos pagãos, alguns dos quais sobrevivem como cativos, sob a forma de uma coluna e do seu capitel, integrados na nave da catedral, concluiremos que a história não nos conta outra coisa.

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